quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Simetrias

Éramos duas retas, paralelas
E mesmo sem simetrias de reflexão,
Ou pontos de interseção
Quis o destino nos unir num ponto próximo
Seguimos as coordenadas do ponto
E se antes éramos apenas ângulos adjacentes
Possuíamos alguns planos em comum
Hoje somos essencialmente complementares
Contrariamos a ciência que nos diz
Que paralelas não se encontram jamais
Criamos um feixe de afetos
Sem extensão e propriedade matemática que explique
Amanda Seabra

sábado, 13 de agosto de 2011

O rádio apaixonado

``Rádio de carro aumentou volume sozinho até pifar, afirma leitora. "Comecei a observar que o rádio esquentava o botão se a frente fosse deixada nele. Logo depois, começou a ficar louco: aumentava o volume sozinho, até parar de funcionar". Ela disse ainda ter notado um som estranho que saía do interior do aparelho. "Só posso escutar o rádio com o carro ligado e, a cada vez que o ligo, ele está todo desconfigurado. O meu MP4 queimou ao ser ligado ao rádio". Cotidiano, 3 de março de 2008. ``


MINHA QUERIDA DONA, sei que você anda se queixando de mim, publicamente, até. Você não pode imaginar o sofrimento que isto me causa, mesmo porque você provavelmente acha que rádios são objetos inanimados, sem vida própria.
Você está enganada. Ao menos no meu caso, você está enganada. Ao contrário do que você pensa, tenho sentimentos, tenho emoções. É em nome desses sentimentos e dessas emoções que lhe falo agora, tanto em AM como em FM. Na verdade, eu nem tinha tomado conhecimento de minha própria existência, até que fui instalado em seu carro.
Você estava muito feliz; tinham lhe dito que minha marca é ótima, e que você contaria com um som maravilhoso para lhe ajudar no estresse que é esse trânsito. E, eu colocado no meu lugar, você me acariciou, você tocou os meus botões. Senti um verdadeiro choque, eu que já deveria estar acostumado com eletricidade. Você fez de mim um ser vivo.
Vivo e apaixonado. Daquele momento em diante, passei a ansiar por sua presença. Era para você que eu queria transmitir as melodias que recebia por meio de tantas canções. Você ao volante, minha felicidade era completa.
Acontece que você não se deu conta disso, ou fingiu que não se dava conta disso. Você me ligava, você sintonizava uma emissora qualquer e pronto, voltava à sua vidinha. Pior: tratava-se de uma vidinha partilhada. Amigas embarcavam em seu carro. Amigos também. Você conversando com um homem, aquilo me dava ciúmes, ciúmes terríveis. O Bentinho, do Machado de Assis, aquele que desconfiava da Capitu, não sofreu tanto. Lá pelas tantas eu tinha ciúmes até do seu MP4.
Agora: o que poderia eu fazer? Humanos têm como demonstrar seus ciúmes, têm como descarregar a frustração. Mas eu sou um rádio, um bom rádio, mas rádio, de qualquer maneira. A mim não estava facultado fazer cenas. Recorri, então, àquilo que estava a meu alcance: o som.
Quando você estava com alguém de quem eu não gostava, eu aumentava meu volume - e volume, você sa
be, é coisa que não me falta- até chegar a níveis insuportáveis, uma avalanche de decibéis. E aí, subitamente me calava. Para lembrar a você que o silêncio também fala, especialmente o silêncio dos traídos. Ah, sim, e queimei o seu MP4. Tinha de queimar: era ele ou eu.
Você foi se queixar com um técnico, achando que eu estava desconfigurado. Num certo sentido você está certa: estou desconfigurado, estou desfigurado, estou perturbado -mas tudo isso por causa do sofrimento que você me causou.
Querida dona, estas são minhas derradeiras palavras, antes de sair definitivamente do ar, antes do silêncio final. Minha última mensagem é esta: nunca brinque com os sentimentos de um rádio apaixonado. Você vai ter, no mínimo, surpresas desagradáveis.
                                                                                            MOACYR SCLIAR

segunda-feira, 14 de março de 2011

Não era uma vez!

Se as fábulas infantis de outrora fossem escritas hoje em dia, tudo seria diferente, o Lobo Mau estaria mal, muito mal, combalido na cama da vovozinha, que teria saído de casa para passar trotes em algum telefone público. O lobo teria sido vítima dos três porquinhos, que lhe contaminaram com a gripe suína. Nesta história ao invés dele ter soprado neles, foram eles que assoaram o nariz perto dele.
Os porquinhos por sinal, não seriam apenas três, mas sim, milhares, que atirariam lixo pelas janelas dos carros, ou em terrenos baldios, ou ainda despejando detritos industriais em rios, sem preocupação nenhuma com reciclagem ou meio ambiente, e teriam a alcunha de sociedade.
Se não bastasse a gripe, o lobo ainda seria acusado de atentado violento ao pudor e canibalismo contra uma tal Chapeuzinho Vermelho, uma das lideres do comando vermelho, e conhecida no bosque encantado como a maior traficante de “docinhos” alucinógenos da região.
No caso de João e o pé de feijão, seria João que passaria o conto do vigário nas negociações, trocando vacas loucas por sacas de feijão, que ficariam armazenados em gigantescos silos subsidiados pelo governo, que ainda pagaria a João para guardá-los, mantendo assim o preço de mercado.
João também aprontaria das dele com sua irmã Maria, existindo inclusive boatos de que juntos eles teriam saqueado uma pobre velhinha, vandalizando sua casa e ainda chamando a coitada de bruxa. Tudo isso em decorrência do vício de ambos por “docinhos”, onde faziam de tudo para consegui-los. Seriam considerados como dois exemplos de jovens perdidos no bosque encantado.
A Cinderela da atualidade passaria o rodo na casa da madrasta, deixando-a sem nada, e fugiria com um tal de príncipe, marginal conhecido, que não engolia sapos de ninguém. Já a Branca de neve ganharia este apelido em decorrência do pó que forneceria aos seus convidados em suas festinhas privativas para políticos entre outras personalidades influentes, utilizando anões nas suas operações, que em áureos tempos também já foram conhecidos como anões do orçamento, em terras brasilis.
Nos dias de hoje Pinóquio não seria literalmente um cara de pau, mas ainda assim seria um baita mentiroso, provavelmente entraria na política, mas ao invés de crescer o nariz, o que cresceria absurdamente seria sua conta bancária.
Estamos vivendo em um mundo onde os contos de fadas foram trocados pelos games, os príncipes e princesas por uma tentadora carreira (entenda-se isso em todos os sentidos) e a infância cada vez mais vem deixando de acontecer em meio a uma antiga bolha de fantasias, onde era a cegonha que trazia os ovos de páscoa e Papai Noel era pregado na cruz. As novas fontes de utopia são uma mescla entre o real e o digital. Um mundo em que pequenos e inquietos “pré-adultos” se formam antes mesmo de serem adolescentes.
Enfim, um mundo onde muitos adultos sentem-se tão obsoletos quanto seus saudosos contos de fadas de antigamente, sem conseguirem assimilar o que estas mudanças causarão as futuras gerações, que já há um bom tempo vem atropelando estas recordações com uma carruagem envenenada de abóboras transgênicas.

sábado, 18 de setembro de 2010

Sabe aqueles dias que você fica tentando terorizar quem realmente é? Pois é, não é nada fácil se descrever quando se pensa que se conhece. Mas eu sou assim, posso não me conhecer, contudo eu sou. Pior seria se eu não fosse. Gosto de fugir por um tempo, de sumir, nem que seja em meus pensamentos. Às vezes eu só estou em matéria, e pode ter certeza, que o lugar que eu não estou, mas que eu queria estar, é mais interessante do que o que eu aparento estar... Sou inteira quando estou com quem eu amo. Falo na cara. Fico estressada fácil. Perco as rédias quando outrém diz o que não cabe, faz o que não diz. Entristeço quando me decepciono, e me decepciono quando entristeço. Sou louca. Louca. Faço as coisas em cima da hora. Falo coisas antes do momento. Jogo tudo pra cima e choro. Choro. Ah, tenho crises existênciais! E nessas crises, eu escrevo melhor, eu penso, e por tanto pensar, vejo o quanto o mundo todo é hostil... e entro em crises existenciais profundas... A melhor coisa é quando eu me encontro em um livro, fico impressionada como alguém que não me conhece consegue compartilhar como eu me sinto, ou como sou, de uma maneira tão ímpar, passo muito tempo lendo uma frase, ou melhor, entendendo. Pulo as páginas que me parecem frívolas. Risco o livro. Me conforto no livro. Tenho dúvidas, sobre tudo. Sobre todos. Demoro pra dormir. Esqueço o que sonho. Sonho acordada quando leio. Leio por isso. Estendo um drama muitas vezes desnecessário. Inteligência me encanta. Criança me encanta. Pessoas me surpreendem. Pessoas me desapontam. Me iludo no começo. Caio na real fácil. Não gosto de nada limitado, nem de gente limitada. Converso sobre tudo. Sem dogmas. Vivo por algum propósito, e é por ter um que continuo viva. Penso muito sobre de onde vim, pra onde vou... coisas que eu nunco encontro respostas... e se encontrasse, qual seria o propósito, e a graça?

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Pois é

Pois é, não deu
Deixa assim como está sereno
Pois é de Deus
Tudo aquilo que não se pode ver
E ao amanhã a gente não diz
E ao coração que teima em bater
avisa que é de se entregar o viver

Pois é, até
Onde o destino não previu
Sei mas atrás vou até onde eu consegui
Deixa o amanhã e a gente sorri
Que o coração já quer descansar
Clareia minha vida, amor, no olhar

Los Hemanos

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Todos os brasis.

Por falta de tempo e por conta de muitas leituras que foram solicitadas na universidade, não tenho tido muito tempo de escrever alguns bordões aqui, o fim de semana está por vir ( thanks God), e eu ficarei mais um pouquinho aqui no blog. Segue abaixo um texto muito interessante da Martha Medeiros. Espero que gostem e que ele provoque muitos questionamentos e reflexões em todos. Beijos.


Todos os Brasis
 
Martha Medeiros

Pra cada ignorante como o Severino, há um cabra-macho como o Gabeira.

E pra cada Gabeira, que diz as coisas que pensamos, há um sem-número de deputados que falam, falam e só dizem besteira.

Há mulheres lindas neste Brasil, feitas de silicone, e mulheres lindas como Regina Casé, feitas de material mais caro.

Há bom humor no nosso país, e também grosseria travestida de novidade, arrancando um riso deplorável.

Há muita gente que dança, no sentido de se dar mal, e tem a Companhia de Dança Corpo, orgulho nacional.

Tem teatro nas CPIs e teatro para comover. Tem gente se fazendo, e tem gente fazendo o Em Cena.

O Brasil das favelas é o mesmo Brasil de Fernando de Noronha, o Brasil da falta de remédios é o mesmo Brasil do Drauzio Varella, o Brasil do Ariano Suassuna é o mesmo Brasil do Maluf.

Produzimos um Washington Olivetto e um Duda Mendonça no mesmo solo, no mesmo mercado, e Denise Frossard respira o mesmo ar de um Fernandinho Beira-Mar.

O Brasil dos meninos malabaristas em sinais de trânsito é o mesmo Brasil dos meninos que jogam capoeira, o Brasil de Robinho é o Brasil dos Robinhos também nas sinaleiras.

O brasileiro que nunca te estende a mão tem um irmão que te empresta dinheiro. E este um primo que te esfaqueia pelas costas, e este uma namorada que te dá bola. Pra cada lado que você olha, há uma possibilidade de sim e de não.

O Brasil dos Verissimo é o mesmo Brasil dos falsíssimos. O Brasil dos otários é o mesmo Brasil dos casos raros. Lembra do Betinho? Do Décio Freitas? Do Darcy Ribeiro? Procuremos, todos deixam herdeiros.

O Brasil rico de qualidades está dentro deste mesmo Brasil miserável e obscuro. Qual deles comemoro? Um não anula o outro, mas ainda aguardo o tal Brasil do futuro.





domingo, 8 de agosto de 2010

Dia dos Pais

É inevitável, no dia de hoje, lembrar-se do Pai. Não necessariamente do meu pai, mas da paternidade em geral, daqueles que estão presentes, ao lado de seus filhos, que os dão grandes exemplos e servem de referência, seja em matéria, seja em espírito. É um momento em pensar naqueles, também, que, na verdade, nem deveriam ser considerados pais, seja pela ausência, ou seja por outro motivo, ainda que biologicamente o sejam, como qualquer ser masculino do reino animal. Afinal, que pai é esse que abandona seu filho? Que pai é esse que engana, que mente, que diz não ter condições de pagar uma pensão para seu filho ( o que é seu direito)? Ou que pai é esse que acha que exerce sua função apenas por colocar comida em casa? 
Numa definição mais ampla (e superficial) sugerida pelo dicionário, pai é o gerador; genitor; progenitor, mas será mesmo que o papel do pai é apenas, ''gerar''? Hoje é Dia dos Pais, mas não de todos, e sim daqueles que estão presentes, daqueles que estão casados, solteiros, empregados, desempregados, que moram longe, ou que moram no mesmo teto, seja de cabelos brancos ou pretos, de bigode ou não, nada disso importa. Importa que se importe. Não basta ligar algumas vezes na semana, ou dar o dinheiro do lanche, achando que ''está fazendo a sua parte'', é preciso que se envolva, que conheça realmente os seus filhos, quando eles estão felizes ou tristes, seguros ou com algumas incertezas, precisando de ajuda ou totalmente independentes.
Que cobre, se for necessário, e para isso, apesar de falho e humano, como todos somos, se torne um exemplo. Que saiba dar aquelas broncas duras, puxões de orelha, mas que também saiba se desculpar e agradecer. É também necessário que os pais conheçam quando seus filhos atinjam uma maturidade digna de uma confiança mútua, pois essa é a base de um bom relacionamento. Que busque conquistar o carinho... Mais que isso! Que saiba dar seu carinho. Imensuralvelmente.
Parabéns para Aldo, Luiz, Armando, Alberto, Pablo, João, Joaquim, Fernando, Mateus, Antônio, Eduardo, Manuel, José, Gustavo, enfim, para todos os que um dia se tornaram pai, e, desde então, tem sido Pai em todos os momentos.

Cordialmente, Amanda.